sábado, 28 de setembro de 2013

Carta de Caioca a Mateus.



Irecê, 24 de março de 2001

Querido Teteu,

            É com muito orgulho que vejo o caçula dos meus rebentos abrir asas e alçar voos. É parte importante da formação de um homem a saída de casa para encarar a vida lá fora. Sinto tantas saudades de ti, mas sei que tem seus sonhos e objetivos, deve pois ir buscá-los. Sei que irá conseguir, mas não posso deixar de me preocupar, todo pai se preocupa com os filhos, ainda mais se o filho possui defeitos, digo características, tão marcantes, como as que você tem. Destartes, não pude me furtar a dar alguns conselhos.
            Em primeiro, sei de suas dificuldades obrativas quando encontra-se em banheiros estranhos. Confesso que nunca entendi esta frescura de suas tripas em recusar-se a evacuar numa privada nova, mas quero hoje ajudar e não criticar. Então, se tiveres muito entupido, recomendo fazer uma vitamina de mamão bem maduro, adoçada com mel legítimo, e uma pitadita de nada de leite de magnésia. Funciona muito bem com as vacas lá do Achado, as vezes eles comem muita fruta de palma. Tadinhas! Porém, se isto não resolver, lambuze seu orifício de excreção com um pouco de vaselina para lubrificá-lo. Creio que algo que sirva para facilitar a entrada possa servir para facilitar a saída.
            Quero alertar também para seu comportamento. Irás para uma cidade grande, de modos e costumes diversos dos daqui. Não deve se exaltar muito na presença de estranhos. Podem tentar aproveitar de ti. Quando encontrar alguém diga bom dia, como vai, até logo. Nada de "oizinhos", "alozinhos", "tchauzinhos", e quaisquer outros "inhos". Se comporte! Se possível, se comporte como macho. Também evite estas conversas sobre fadas e duendes, desenhos animados do tempo do ronca, chocolates que não são mais fabricados, e toda essas coisas dos anos oitenta. A sua aparência transmite a ideia de que és maluco, se falas nestas coisas terão certeza disso. Não quero te ver internado num sanatório.
            Me preocupo com a carreira que escolheu, dizem que o mercado para filosofadores (é isso que irás estudar?) esta restrito. Não quero frustar-lhe, nem te obrigar a nada, mas caso queiras regressar e estudar para outro curso com mais futuro, lhe receberemos de braços abertos. Ademais, ontem vi um anúncio de emprego e lembrei-me de você. Era um bom cargo; vi na vitrine da loja de eletrodomésticos que precisavam de um gerente, remuneração inicial de mil e seiscentos reais, mais comissão. Bom, não acha? No fim do cartaz, ainda tinha uma observação que me encheu de esperanças, assim dizia “observação: inútil apresentar-se sem referências”. Como você sempre foi um inútil e nunca teve referência alguma é o candidato perfeito ao emprego. Pense bem nesta possibilidade.
            Anexado com o clipe está uma foto de minha pin-up favorita, Gina Lollobrigida. Verás que bela pernas esta pequena tem. Será útil nos seus dias de solidão. Agora não conta para sua mãe viu? Será nosso segredinho. Também ia te mandar uma nota de cem, para aquela cervejinha do sábado, mas não o fiz por que já fechei o envelope. "Ô rapái", que pena! Só depois que coloquei a carta no correio que fui me lembrar do dinheiro.
            No mais, aqui está sem novidades.


Um grande abraço de seu velho pai.
Atenciosamente e saudosamente,

Caioca.

            

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Em meu peito pulsa uma Cruz de Malta

Em meu peito pulsa uma Cruz de Malta


Por DANIEL PABLO
Direitos Reservados

Neste espaço criado para homenagear (sacanear) nosso nobre amigo Mateus, não poderíamos deixar de tecer algumas linhas sobre uma de suas maiores imperfeições, digo característica, a sua paixão pelo Clube de Regatas Vasco da Gama.
O menino Teteu se encantou pelo clube da Cruz de Malta no final de 1989, ano em que o Gigante da Colina conquistou seu segundo título nacional. Mateus não assistiu ao jogo decisivo em que o Vasco bateu o São Paulo em pleno Morumbi, mas se apaixonou quando viu nos dias seguintes as pessoas envergarem orgulhosas a camisa cruz-maltina, assistiu as reportagens na televisão, se deslumbrou com a história do time. Nascia aí uma grande paixão.
No ano seguinte, o narigudo passou a assistir a todos os jogos de seu novo amor, acompanhou em detalhes a campanha da equipe no campeonato carioca de 1990, e que bela campanha, o Vasco chegou a final como favorito, e Mateus estava lá, olhos vidrados e brilhantes, grudados na telinha, ansiando por assistir pela primeira vez uma conquista de seu time, mas, Gooollll do Botafogo! O Fogão ficou com a taça este ano. Mas Mateus não desanimou, muitas conquistas virão pensou ele.
E as conquistas realmente aconteceram. Nos anos seguintes o Vasco conquistou pela primeira vez três títulos seguidos, foi tri do carioca em 92/93/94. Só que Mateus não pode acompanhar os jogos decisivos desses triunfos, as finais são jogadas no domingo, bem no horário do novo programa de Silvio Santos, o favorito de Dona Gustinha, e como na casa só tinha uma televisão, e Caioca monopolizava o rádio escutando Tonico e Tinoco, só restou a nosso herói se deleitar com as vitórias nos dias seguintes, assistindo aos debates futebolísticos de meio-dia.
Mas o tempo passou a família prosperou e em 1996 conseguiram comprar uma segunda televisão. Que maravilha, agora Mateus vai conseguir ver ao vivo um título do Vasco, só que Gooollll do Flamengo. A taça foi para a gávea. Mas não tem problema, muitas conquistas virão, e com dois televisores Mateus vai assistir a todos os jogos.
Ano seguinte, o Vasco tinha um timaço, Edmundo estava no auge, e tinha vencido o primeiro jogo da final do carioca. Mateus estava confiante, tinha comprado um K-7 do É tchan  e já tinha ensaiado a dança da bundinha para comemorar mais este título, mas Gooolll do Botafogo!  A taça foi para General Severiano. Mas não tem problema, outras conquistas virão.
No mesmo ano, o cruz-maltino chegou a final do brasileirão. O animal tinha se sagrado o maior artilheiro em uma edição da competição, e iria jogar a final, mesmo tendo sido expulso no jogo anterior. Mateus estava muito confiante em frente a telinha, mas rola bola e a imagem e som desaparecem. "Oxi, a TV pifou? E justo agora, na final do Brasileiro, essa porra vai dar defeito! Que merda"! Irascível, Mateus, igualzinho ao Sr. Madruga, derruba o televisor no chão e o espatifa em mil pedaços. Após este ato alguém avisa que faltou luz. Quando esta volta Mateus ainda tenta ir na casa de Duca assistir o segundo tempo, mas Gustinha o deixa de castigo por ter destruído a televisão. Só no dia seguinte Mateus descobre que o Vasco foi campeão brasileiro. Mas não tem problema, outras conquistas virão.
E veio a maior delas, o Vasco chega a final da taça libertadores, e no ano do seu centenário, 1998. Foi um ano maravilhoso, muitas reportagens especiais sobre a história do clube, bela trajetória que chegaria ao ápice numa noite de quarta feira, com a conquista da América, e Mateus estava lá, prontinho para assistir. Mas a emoção foi muito grande, nosso amigo teve um ataque histérico, precisou ser sedado e passou uma semana numa clínica de repouso. Quando voltou, Caioca teve o maior cuidado em dar a notícia da vitória para o filho. Uma pena ele não ter assistido a esta final, mas não tem problema, vem aí o mundial, e essa conquista Mateus irá assistir.
E assistiu mesmo, nos meses em que antecederam o torneio intercontinental Mateus fez terapia com psicólogos, fez uso de calmantes (dizem que usava gardenal), se preparando para acompanhar a conquista máxima de seu clube do coração, só que Gooolll do Real Madrid. Não foi desta vez que o Vascão conquistou o mundo, mas não tem problema outras conquistas virão.
Mateus demorou mais de um ano para se refazer da derrota para os Madrileños, mas recobrou o ânimo com a chegada do Vascão em mais uma final, desta vez, em um mundial de verdade, com representantes de todos os continentes, organizado pela FIFA, e a decisão ia ser no Rio de Janeiro, casa do Cruz-maltino, chupa Real Madrid. Porém, Edmundo bate um penalty bisonhamente e o título fica com o Corinthians. Mas não tem problema, alguma conquista virá.
No final do ano 2000, o narigudo assistia desolado ao baile que seu amado Vasco tomava do Palmeiras na final da copa mercorsul. Era muita humilhação, ser tri-vice no mesmo ano, antes já tinha perdido o Mundial Fifa para o timão, e o carioca para o Flamengo. Não pode mais assistir, assim que o Verdão fez 3x0 desligou a TV e foi chorar na cama. No mesmíssimo instante que Mateus desligava a TV o Vasco marcava o primeiro dos quatro gols que faria, protagonizando uma virada espetacular em 15 minutos, ganhando o jogo (4x3), o título e a alcunha de time da virada. Mateus só soube disso uma semana depois.
No inicio de 2001, Mateus já ciente da super virada contra o porco, assiste empolgado aos primeiros lance da decisão entre Vasco e o surpreendente São Caetano, mas a televisão fica muda e sem imagem novamente. "Que merda, toda vez que o Vascão ta na final do campeonato brasileiro falta luz". O jeito é esperar a energia voltar. Só que desta vez não faltou luz, foi a televisão que pifou. Mas Mateus não sabia disso, ficou lá sentando esperando duas horas em vão e energia ser restabelecida. Só depois que acabou o jogo foi que ele percebeu o engano. Ainda conseguiu ver as derradeiras imagens da volta olímpica do Vasco, na outra TV. Uma pena não ter assistido a mais este título. Mas não tem problema, outras conquistas virão.
No mesmo ano, Mateus vibra e canta com a vitória diante do maior rival que ele assiste pela televisão, faltam poucos minutos para saltar o grito de campeão carioca, brado entalado em 99 e 2000. "O Vasco é o time da virada, pode perder duas finais seguidas, mas três? Nunca". Porém, gooollll do Pet! O Flamengo é campeão! O narigudo quase teve outro ataque histérico. Mas não tem problema, talvez alguma conquista aconteça.
Em 2003 o Vasco chega mais uma vez a final de um campeonato carioca, desta vez contra o Fluminense, que naquela época era uma bosta. O título tava no papo, mas Mateus não pode assistir a este triunfo, no outro dia tinha prova final, teve que abdicar do jogo. Ou passava na avaliação ou perdia na matéria, disciplina que era pré requisito para outras três do semestre seguinte. Teve que optar, pelos estudos, não viu seu time ser campeão do Rio pela 22ª vez. Mas não tem problema, outras conquistas virão.
Em 2006, o Gigante da Colina chega pela primeira vez a uma final de Copa do Brasil, e mais uma vez contra o arqui-inimigo. Mateus esfrega as mãos de prazer enquanto assiste ao jogo. Iria se vingar dos flamenguistas que ficavam lhe pirraçando. A mais de vinte anos que o seu time não perde um decisão nacional. "Ganhar carioqueta é fácil, quero ver ganharem do Vascão em brasileiro ou em CB". Mas ganharam. Gooollll do Flamengo, e vice de novo. Mas não tem problema, o importante é competir.
Nos anos seguintes, os resultados do Vasco foram pífios, nem em finais de turno do carioca o time conseguia chegar. Mas a paixão mantinha-se inabalável. Foi nesta época de vacas magras, que Mateus conseguiu realizar um dos seus maiores sonhos: ter uma camisa oficial do Vasco. Em 2008 nosso herói compra pela internet a tão sonhada camisa do seu querido clube, no mesmo ano o Vascão é rebaixado pela primeira vez em sua história.
Mas, o sentimento não pode parar, a massa cruz-maltina  não abandou o clube, e com este apoio das arquibancadas o Vascou venceu a segunda divisão e voltou para a elite. Só que Mateus não acompanhou esta heroica epopeia, por recomendações médicas foi proibido de assistir aos jogos. O rebaixamento foi demais para ele.
Com o Vasco de volta a primeira divisão, Mateus se restabelece dos nervos, e agora com todos os recursos tecnológicos possíveis para acompanhar seu time do coração: dois televisores, com TV a cabo, PFC, computador, not-book, net-book e celular com internet, além de um radinho de pilha já sintonizado na emissora que transmite futebol, não tem mais como perder um lance. Agora, nada pode impedi-lo de assistir as conquistas do Vasco, e ele assiste, nos mínimos detalhes, a todas elas:  vice da taça Guanabara 2010, vice da taça-rio 2011, vice carioca 2011, vice brasileiro 2011, vice da taça Guanabara (de novo?) 2012, vice da taça-rio 2012, vice carioca de 2012, vice da campeonato de peteca, vice da....
- Êpa! Paratudo! Paratudo!
- Paratudo uma hora dessas Mateus? Não ta cedo demais para encher a cara?
- Não tou falando da bebida, tou mandando você parar tudo o que ce ta escrevendo.
- Mas por que? Tou escrevendo alguma mentira?
- Não, mas ta omitindo a ultima conquista do Vascão. Você so fala vice, vice, vice...,
- Ih, é mesmo, com tanto vice tinha me esquecido deste título. Perdão Mateus, irei falar dele agora.

E eis que em 2011 o Vasco volta ao lugar mais alto das competições nacionais com a conquista da Copa do Brasil, e Teteuzinho estava lá, em frente a telinha, acompanhando pelo lance a lance da internet, e com o radinho de pilha sintonizado na transmissão do jogo. Mateus está lá na sala de sua casa assistindo aos primeiros minutos da partida quando houve uma pancada na janela. Se assusta, outro golpe e a janela se abre adentrando por ela uma homem encapuzado e todo vestido de negro. Apavorado nosso herói tenta fugir pela porta, mas é impedido por dois outros homens, igualmente encapuzados, que por ela entravam. “O que isso? Estão me sequestrando”. Mateus tenta se desvencilhar das mãos que o agarram. Mas são três contra um. O jeito é gritar, pedir ajuda, mas antes que pudesse fazer isso, lhe dão uma injeção de sedativos. O narigudo apaga.
Duas horas e meia depois Mateus acorda. Não sabe onde está. Abre os olhos e nada enxerga. Há um saco em sua cabeça. Seus braços e pernas estão amarrados. Consegue apenas ouvir o celular de um dos seus captores que toca:
- Alô! Chefe!?
- Sim, sou eu. O jogo já acabou, ganhamos a copa do Brasil, podem soltar o pé-frio.
- Ok seu Eurico, vamos liberar ele agora.




sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O Jogador - II


por Daniel Pablo
Direitos reservados


A vitória no poker foi o momento máximo de sua vida, extasiado, Mateus se sentia no Nirvana, sentia seu corpo flutuar enquanto voltava para sua casa, o sol se levantava no oriente, e sua luz doirava todas as coisas. Esse foi o alvorecer mais dourado que se viu, tudo os que seus oclinhos de tartaruga viam, reluzia a sua riqueza, sua embaçada estrela finalmente brilhava. Entrou em sua casa, descuidado e distraído, mas estava tão leve que não vez o mais leve ruído. Deitou-se em sua cama, olhava o teto e apesar de ter passado a noite em claro na jogatina, não conseguia dormir, e nem estava cansado. Ficou devaneando durante as primeiras horas da manhã, lembrando-se dos feitos de tão memorável noite, na sua mente notas, moedas, fichas, cartas e um número: 6.127, dançavam. Esses algarismos eram o premio de Mateus ganhou no jogo, incríveis seis mil, cento e vinte sete reais. Para quem quase teve uma epifania com dez contos, alguns milhares era como ganhar na loteria, ainda mais que fora uma conquista e não uma esmola. Sentia-se poderoso.
Seus devaneios foram interrompidos pelo grito histérico de Carla:
- Mãinhaaaaaaaaaaaaaaaaaaa! Mateus não chegou em casa!
Mas, Mateus não estava tranquilamente em sua cama, saboreando os louros da vitória? Sim estava. Mas Carla ainda não tinha entrado no quarto, para ela o irmão ainda não tinha regressado, pois sempre que este volta das bebedeiras faz muito barulho, tem dificuldades de abrir o cadeado, demora a acertar o buraco da fechadura, já na sala, esbarras nas coisas, e no banheiro chama Raul, emporcalhando tudo. Só que esta amanhã a casa está em ordem e o banheiro limpo. Só pode concluir a moça que seu mui querido irmão foi sequestrado, soltando o berreiro por isso:
- Mateeeeeeeeeuuuuuuuuuuussssssss onde estaaaaaaiiisssssssssss ??
O escândalo traz Mateus de volta a realidade, e o aborrece muito. Sai do quarto com cara de mau, de meter medo até nos brutos do Vegas Bar, e da uma enquadrada na irmã:
- Qualé? Qual foi? Que gritaria é essa? É para ficar caladinha viu?
Carla impressionada com a atitude e o timbre de voz de Mateus baixa as orelhas e se recolhe. Os pais de ambos presenciam a cena e se alegram muito, finalmente vêem o filho caçula agir como um homem adulto. Ele é nova criatura agora, nesta manhã ensolarada está mais calado, compenetrado, não ri muito, está mais lacônico, não reclama e não pede nada.
Mas sai pelas ruas e se enche de alegria, saltita pelas calçadas e da bom dia as flores. Precisa urgentemente comemorar, mal chega a noite se dirige ao restaurante mais sofisticado da cidade. Pede as mais finas iguarias e o mais caro champanhe. Paga uma rodada de rum para todos os presentes, e estes saúdam o novo rei da noite. A confiança e o brilho de nosso herói reluzem mais que a taça de cristal que segura, contendo ela um bom vinho do porto. Convida garotas para sua mesa, mas sua postura é outra, e as damas aceitam, janta agora em ótima companhia. Conta suas façanhas com as cartas, impressiona suas novas amigas. Ao final da ceia, escolhe uma e vai para o mais luxuoso hotel, mas antes deixa rechonchuda gorjeta para o taxista que o conduzira. Na hospedaria exige a melhor suíte. Do serviço de quarto, ordena canapés, caviar e mais champanhe. Tem uma noite de delícias, a bela moça e lhe dar uvas na boca, enquanto acaricia seu corpo. Come, bebe, e come (agora a mulher) muito bem. Dorme num confortável colchão de molas, parece que está deitado em nuvens, e uma doce brisa lhe alivia o calor, é a rapariga que sopra seu rosto enquanto sonha. E sonha com cascatas de cachaças cristalinas, sonha com bordeis encantados, onde as putas são as quatro damas do baralho, e todos os móveis são de marfim, homenageando as pedras de dominó. Sonha com fontes em formatos de virgens, e das suas bocas jorram líquidos diversos, mas nenhuma delas é água, e sim os mais sublimes álcoois, nunca havia experimentando tão saborosos whiskies, nem encorpados conhaques, nem tão cremosas cervejas, nem tão forte ParaTudo. Acorda no outro dia, pela primeira vez nos braços de uma bela moça.
Está decidido, experimentou um pouco do céu, não pode suportar mais a dura realidade, precisa desfrutar perpetuamente as delícias da vida, e já tem os meios para isso. Voltará as mesas de jogo, e jogará mais alto. Os neurônios do homem normal anunciariam que os riscos são muito grandes, a sorte das cartas sorri com escassez. Para a maioria apenas uma vez. Nos jogos de azar, os ganhos são acontecimentos, mas perder, rotina. Mas Mateus está fora de si, quer desfrutar de novo é que lhe foi negado por tanto tempo. Volta ao Bar, mas desta vez foi diferente.
Está tão confiante que esquece até de roubar, única vez que isso aconteceu na vida, e aposta com arrojo. Nas primeiras partidas até que é bem sucedido, mas conforme a noite avança, os adversários mais fracos são eliminados restando apenas jogadores experientes, e aí a maré muda. Mateus começa a perder dinheiro sistematicamente, há momentos em que pensa em desistir, e poupar o que ainda lhe resta, mas ganha uma partida e recobra o ânimo, neste ritmo vai até chegar novamente a mesa final, com apenas quatro campeões disputando o título supremo da noite.
Nesta decisão, novamente está o rival derrotado de sua primeira glória, e desta vez ele está disposto a ir a forra. Dos quatro finalistas, Mateus é o que possui menos recursos financeiros para apostar, e o revanchista o que possui mais. Com tanto recursos ele manobra o jogo, eliminando outra vez os dois outros concorrentes, mas deixando Mateus para o gran final. Como da primeira vez, faz grande aposta e exige que nosso herói a cubra, mas este não tem a grana suficiente (nem há cartas no chão que possam mudar sua sorte) explica o fato e pede clemência.
Uma sonora gargalhada geral ecoa pelo salão de jogos. Alguém lembra ao narigudo as regras da casa, na mesa final apenas um pode sair com tudo, e o adversário não tem tudo ainda, restam ainda alguns trocados com Mateus. Mas essa quantia não é suficiente para cobrir aposta. Tenta argumentar. A risada agora é sinistra, os brutamontes se aproximam tenebrosamente do nosso herói.  Regras são regras meu caro novato, dê seu jeito, aqui não gostamos de quem não segue as regras (ah se eles imaginassem o que Mateus vez na primeira noite que veio ao cassino). O suor frio escorre da testa do quixotesco filósofo, sente um pisão de toneladas no seu pé, uma mão grossa e cabeluda lhe aperta o ombro, dói muito, sente uma baforada de fumaça de cigarro na cara, alguém lhe apaga um charuto no braço, está preste a virar picadinho se não cobrir a aposta, mas não há como fazê-lo. E agora?
- Novato, tu não tem nada de valor contigo que possa lançar a mesa? – pergunta-lhe o adversário.
A indagação foi um alento, prontamente os ferrabrases se afastam, e Mateus saca um celular.
- Isto é suficiente? – pergunta ao outro jogador.
- Não.
- Mas ele é moderno, tem muita memória, você pode armazenar muitas músicas e usar uma diferente a cada chamada – tenta valorizar seu objeto, é a única coisa de valor que possuí.
- É um bom celular – comenta um dos que assistem a partida.
- Mas não é suficiente – sentencia o adversário.
- Mas ele tem muitas musiquinhas legais, saca só – Mateus insiste, e acionar o celular:
mexe, mexe, mexe com as mãos chiquitas
Mexe, mexe, mexe  com os pés chiquititas ...”
Nunca o ditado “em boca fechada não se entra mosca” ou ainda, “é melhor ser mudo do que falar besteira”, se aplicou tão bem em uma situação. Só mesmo um Zé Ruela para tocar chiquititas no bar mais barra pesada do interior da Bahia. As consequências não tardaram a aparecer:
- Esse teu “celugay”, novo e ainda na garantia vale uns trezentos paus, mas tocando esta merda de música não vale porra nenhuma, joga esta bosta na mesa, e mais tudo o que você tem, e ligeiro se não quiser ficar sem os dentes – ameaçou o bar-man caolho, já com um soco inglês na mão direita.
Mateus esvaziou seus bolsos, colocou o celular, um calendário, a imagenzinha de Santo Antônio, uma camisinha, um halls preto e um botão. Não foi suficiente para cobrir a aposta, os caras do cassino se aproximaram novamente, desta vez já com canivetes, e um deles portando um revolver. Será o fim do nosso amigo?
- Tira a roupa e bota na mesa – ordenou o adversário.
Mais uma vez Mateus foi salvo pelo gongo. Ainda tentou argumentar dizendo que estava frio, mas lembram-lhe que ou cobria a aposta ou dançava. Prontamente tirou suas vestes e pós na mesa.
- Ainda não cobriu a aposta.
Mateus quase chora com essa. E agora tou fudido, pensou. Começou a rezar e se arrependeu profundamente do dia em que inventou de jogar apostado. Tentou ainda uma última suplica:
- E..., e... eu nã-nã-não tenho mais nada.
- Ainda tem uma coisinha que eu quero, hehehehehe.
Ai meus Deus, essa cara quer que eu aposte meu furico. Foi o único pensamento de nosso amigo, estava quase a desmaiar diante de tão terrível perspectiva, mas o adversário lhe esclareceu.
- Não é nada disso que você esta pensando, eu quero é sua cueca, põem essa ciroula na mesa, e eu considero a aposta coberta.
Sem escolhas, nosso herói tirou o ultimo trapo que cobria seu corpo, ficou nu em pelo, no meio de tantas pessoas de má índole, maior humilhação impossível. Mas dentro de si, ainda mantinha uma esperança, ainda jogaria uma partida. Quem sabe não ganho e recupero minhas roupas? Se vencesse, levaria também a pequena fortuna apostada pelo adversário. Por que não ter esperanças?
E as esperanças se converteram em quase certeza quando Mateus olhou suas cartas, um double kings e um triple As, nem precisaria comprar cartas. Um riso safado se formou em seus lábios. O adversário estava de cenho preocupado. Comprou uma carta, mas seu semblante não melhorou. Agora a certeza de triunfo se concretizou. Que noite emocionante, de tamanha reviravolta, estava prestes a perder tudo, agora já sente o gostinho de champanhe na boca. Alguém lá em cima gosta dos professores de filosofia.
 O outro cara ainda pensou em desistir, mas foi lembrado das regras pelos demais presentes. O narigudo não conseguia se conter, se levantou e freneticamente sapateava. Mostrou suas cartas enquanto dizia:
- Chuuuuuuuuuuuupaaaaaaaaaaaaaaa babaca! Se fudeu legal! Uuuuuuuuuuuuuuuuuuiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii ! Adorei essa sua cara de bunda. Otário!
Só que era cedo para cantar vitória, enquanto Mateus esperneava e desmunhecava (e fazia tudo isso pelado), o adversário, com a tranquilidade dos vencedores veteranos, expunha o seu Royal Flush de copas. A sequencia mais poderosa do pocker. Ato continuo, todos os presentes começaram a rir.
- Esse cara é mesmo um palhaço, né galera? – Mateus ainda quis tirar onda, supondo que todos riam com ele do adversário derrotado.
- Cara, palhaço és tu. Aprende uma coisa, nunca comemore antes de ver as cartas dos outros. Nunca ouviu falar em blefe?
Estavam na verdade rindo dele. Mateus olhou as cartas do seu rival, viu o full house, mal pode acreditar. Perdeu tudo, o dinheiro, a morenaça que traçaria mais tarde, o White Horse, o celular (substituto daquele que despedaçou por cauda de Carla), as roupas e a dignidade. Foram muitas frustrações para uma noite só, seus nervos não aguentaram. Desmaiou.

Acordou meia hora depois, um cão vira-lata lambia-lhe a cara. Onde estou quis saber? Estava dentro de uma lata de lixo, no meio de um terreno baldio, só com a cabeça de fora. O que aconteceu? Ainda estava zonzo. Perto dali, em um bar gargalhavam. Viram só a cara daquele abestalhado quando descobriu que perdeu a aposta? Mais risadas. Agora lembrou-se do que aconteceu. Ainda estava perto do Cassino, zombavam dele. Levantou-se para ir para casa. Ainda estava nu. Os malditos não tiveram pena de si, o despejaram como veio ao mundo, e assim terá que andar pelas ruas da cidade. Pelo menos um pano de chão para se enrolar. Nem isso lhe deram. Muita malvadeza. Agora o que resta é ir para casa. E quão diferente é esta caminhada. Na primeira vez que regressou da casa de jogos, andou de peito aberto sob a luz do sol, e o mundo parecia lhe sorrir. Hoje, anda cabisbaixo e encolhido, busca as últimas sombras da noite que se encerra, envergonhado de sua nudez. Melancolicamente regressa ao lar. 





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quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Mateus, o jogador.

        Os seus dias se arrastavam modorrentos e enfadonhos. Era um típico exemplar da nova geração Nem-Nem: nem trabalha, nem estuda. Mas não é assim por opção, já concluiu a faculdade, mas ainda não arranjou emprego. Tem tentado, mas para professor de filosofia as vagas são escassas.
         E neste marasmo vai passando suas semanas, sem emprego, sem dinheiro, sem estudo, sem rotina, sem perspectiva, e sem namorada. Os “nem’s”, ou “sem’s”, de sua vida são muitos, mas o que mais lhe angustia, é o último, o sem namorada. Todos os outros “sem’s” busca suprimir com o intuito de extinguir o principal; enxerga diploma, emprego e dinheiro, não como fins, mas meios em sua busca pelo amor.
          Aliviava-se da solidão frequentando a zona da cidade, não é um inveterado frequentador de cabarés, mas ia com uma certa rotina, a cada 30, 45 dias visitava um prostíbulo. Mas até isso está difícil, não tem mais dinheiro. Logo quando chegou, magro e com um canudo enfiado (calma Duca) no bolso, ganhava uns trocadinhos do velho pai, coisa pouca, mixarias iguais as que as crianças recebem para comprar balas. Ele as juntava por semanas até ter algumas dezenas de reais para gastar com as putas. Agora os agrados pecuniários cessaram-se, seu genitor, incomodado com sua vagabundice, fechou-lhe a carteira, fechando-lhe também as pernas das raparigas.
         Seu único consolo é beber, e isso quando acha quem lhe pague uma dose de ParaTudo. Bebe quando pode, e não quando quer. É quase um mendigo. Para sua vida não vislumbra solução. O que lhe resta é perambular sem rumo pelas noites de sexta e sábado torcendo para encontrar um conhecido em algum bar, e que este o convide para beber. E numa destas noites vadias, encontra seu velho amigo Bad Boy em uma mesa de sinuca. Foi uma feliz coincidência, Bad estava com uma garrafa de Montila, mas precisava de um parceiro para um desafio de tacos valendo 50 pilas.
 - E awe Mateus – cumprimenta o camarada.
- Beleza Bad! O que está fazendo? – pergunta Mateus.
- Jogando sinuca apostado. A proposito quer ser minha dupla nessa partida?
- Cara, não sou muito bom. - Relaxa, pode deixar comigo, já rapilei todo mundo aqui no bar, agora só querem jogar parceirados, portanto preciso de você só para fazer número.
            Dito e feito. Mateus errou todas as suas tacadas, mas a habilidade do colega saneou suas mancadas e venceram o certame.
          Ao receber o pagamento da aposta, Bad Boy presenteou o parceiro com dez reais. Foi uma noite satisfatória para o Bad, e de muita alegria e júbilo para Mateus, que ha seis meses não segurava uma nota de dez.
         Só que os efeitos da noite não se resumiram ao contentamento com o dinheiro ganho, uma ideia se encaraminholou na cachola de Mateus: jogar apostado. Isso pode ser arriscado, se alertava as vezes. Mas não há outra alternativa, igualmente se encorajava. Estava duro, e pressionado pela família a conseguir alguma coisa. Ademais, estava em crise de abstinência, a muito não dava umazinha. Resolveu-se por fim, jogaria todas as suas fichas no jogo apostado. Mas em qual jogo? Sinuca era um desastre. Para dama precisaria de inteligência. Xadrez não se joga apostado. Gamão ninguém joga na cidade. Restavam dominó e baralho, os jogos mais praticados no município, e que segundo o amigo Bad, eram os que se apostavam as mais altas quantias. Decidiu-se por estes. Mas não ia aventurar-se sem estar preparado. Durante duas semanas dedicou-se a aprender todas as artimanhas das cartas e pedras. Pesquisou as regras, origens, e jogadas; baixou programas que simulavam as partidas, jogou contra o computador e on-line. Em quinze dias se sentiu preparado, e partiu para o pano verde.
          Com um capital de apenas 5 reais (os outros 5, dos 10 que o amigo lhe dera, deixou em casa) fez sua estreia no mundo ilegal dos jogos de azar, numa roda de palitinho composta por esmolés. Cinquinho era muito pouco, até mesmo para as mesas de dominó e baralho das piores espeluncas, depois de ter sido ridicularizado em três biroscas, restou-lhe jogar na rua. Mas, teve sorte. Apostou seus cinco reais, contra uma coxa de frango de um mendigo e um sapato furado de um doido, e ganhou! Começou com o pé direito. Alguns indigentes começaram a apostar seus parcos recursos financeiros (centavos), e Mateus arrebatou todos. Ao final, teve um saldo de 3 reais, 65 centavos, uma garrafa com dois dedos de pinga, um cigarro já meio fumado, um boné, um calendário, um jornal de velho, uma coxa de frango, dois pães mofados, um penico e um pé de sapato chulerento. Levou seus troféus para a casa, mas não pode coloca-los na prateleira do quarto como tencionava.  Sua família não permitiu que semelhantes porcarias entrassem na residência.
         O sucesso da noite anterior animou-lhe mais, e decidiu desta vez levar todo o dinheiro que possuía, R$ 13,65, era ainda pouca para as rodas de prestígio mediano, mas suficiente para pelo menos uma mão de baralho no Botequim Ponta de Rua, biboca mal-encarada localizada na rua do Pau Rodou. Novamente foi bem sucedido, ganhou sessenta reais. Estava satisfeito, pensou em ir num brega de 4ª categoria e se esbaldar, mas desistiu da ideia. Um cabaré de nível quatro custaria todo o lucro da noite, queria guardar uma parte do dinheiro para futuros “investimentos”, foi então num já conhecido seu prostíbulo de 6ª classe.              Mateus acordou no outro dia como um novo homem, ou melhor, pela primeira vez na vida se sentiu macho. Tinha ganhado seu próprio dinheiro, não teve que pedir a ninguém, batalhou, arriscou e foi recompensado, e para comemorar, fez o que quis. Ainda lhe sobraram R$ 31,45, dava para ir jogar no Vegas Bar, o cassino ilegal mais frequentado da cidade. Tinha ciência que causaria de início má impressão, iria na casa de jogos mais afamada com pouca quantia, o suficiente para duas fichas, e um copo de água. Mas foi.
        Como previsto, ao entrar no recinto chamou logo a atenção. Era um ser totalmente diverso naquele ambiente. O cassino tinha a aparência de um boteco comum, mesas de plásticos com logotipo de cervejas, nas paredes posters de mulheres nuas e uma flâmula do Botafogo F.R. Os clientes mal-encarados, homens de rostos severos e físicos medonhos, barbas por fazer, mal vestidos, braços fortes tatuados, fumavam charutos e bebiam cachaça. Se algum deles encontrasse Mateus em outro lugar daria-lhe uma surra. Mas naquele lugar não, todos estavam impressionados, e admirados com Mateus. Nosso herói com seu jeito acanhado, com suas desmunhecações, com seu passinho curto de quem anda fazendo força para não peidar, ganhou a simpatia dos brutamontes do botequim, todos eles pensavam: “que boiolinha mais corajoso, tem que ser muito macho para vim aqui deste jeito, ganhou meu respeito”.
       Depois da boa impressão que causara na turma, Mateus se dirige ao bar-man e pergunta baixinho aonde estão as mesas de jogo.
 - Queres jogar? – pergunta-lhe o bigodudo, careca e caolho despachante atrás do balcão.
 - Si, si, sim – responde gaguejante Mateus.
 - Tem certeza?
 - Si, si, sim – responde novamente gaguejando.
- Quantas fichas queres?
 - Du, du, duas.
- hahahahahahahahaaha – o bar-man emitiu uma sinistra risada que arrepio os pelos de Mateus, até mesmo as pleuras do cú se enrustiram. Mas entregou as duas míseras fichas, e empurrou nosso amigo para um recinto reservado, nos fundos do estabelecimento, longe da rua e dos olhares dos curiosos. Lá deixou Mateus sentado numa roda de pocker, e ao sair lhe desejou um sinistro: Muchas mala-sorte para ti, muchacho!
        O medo e emoção faziam as mãos de Mateus tremerem, mal podia segurar as cartas, mas jogava, e algumas partidas depois, já acumulava uma boa quantia em dinheiro. Resolveu tomar um trago para ver se acalmava os nervos, pediu ao garçom a bebida barata mais forte que havia no recinto.
- Um El Cabron, senhor? – indagou-lhe o garçom.
- Que é isso? – quis saber o narigudo.
 - Nosso drink classe “C” mais forte senhor. Foi um cliente nosso quem inventou, um tal de Danúbio.
 - Com esse nome deve ser bom, traz um para mim.
         A bebida, embora fosse de classe “C”, a categoria mais baixa, custou um quarto do que Teteu tinha ganho até o momento, mas valeu a pena, finalmente conseguiu controlar seus nervos e deu-lhe mais coragem. As apostas passaram a ser mais elevadas, as jogadas mais arrojadas, e os riscos, ganhos e perdas maiores. Mas Mateus estava com sorte, perdeu muito, mas ganhou mais e o saldo estava sendo positivo.              Porém chegou o clímax da noite, eram quatro horas da manhã e restava apenas uma mesa com jogo, e nela, os quatro maiores ganhadores da noite. Agora as apostas eram mais altas, e os jogadores mais experientes. Era uma espécie de grande final. Pelas regras da casa apenas um dos quatros poderia sair com todo o dinheiro ganho até ali. E começaram as partidas. Mateus estava confiante, já tinha bebido 32 El Cabrons, mas um momento de tensão lhe atravessa o espírito, um dos contendores aposta uma alta quantia, e nosso herói a cobre, mas fez isso antes de olhar as suas cartas, e ao fazê-lo descobre o quão suas cartas são pífias. O adversário percebe sua reação, e soturnamente ri, já prevendo a vitória. Os dois outros contendores já saíram derrotados, e nosso herói esta na iminência de também ser vencido. Mas antes disso mil pensamentos voam na sua mente, lembra-se dos dias vazios, das noites de solidão, da falta de grana, da falta de liberdade, das perseguições da irmã, das cobranças dos pais, do progresso dos amigos enquanto ele fica para trás. Isso não pode mais acontecer. Sua vida precisa mudar, e estava tão perto de conseguir, não pode voltar a estaca zero, não quer mais ser um serrão de bebidas, não quer sonhar com deusas e comer barangas, não, não, não, estou tão perto, não posso fracassar.
         Não há derrota pior do que naufragar vendo as luzes do porto, o desespero toma conta de Mateus, tem vontade de gritar, chorar e desistir, tristemente abaixa a cabeça, e vê, sim ele vê, uma esperança em forma de carta, um poderosíssimo Oito de Espadas jaz aos seus pés, esta carta pode fazer a diferença, mas isso não seria roubar? Um lampejo de consciência irrompe pela sua cabeça, mas as lembranças de sua vida e as possibilidades que o dinheiro de jogo podem lhe trazer o fazem decidir pela trapaça. Discretamente descalça seus sapatos, e aproveitando-se que suas meias estavam furadas, com os dedos do pé direito pega a carta e a coloca no joelho esquerdo, ato contínuo, pega a carta com a mão e a esconde na manga, aproveita um piscar de olhos do adversário e coloca a carta da manga no leque que segura. Finalmente os jogadores apresentam suas cartas. O rival possuia um four of queens, e Mateus um dois de paus, e uma sequencia, 7,8,9,10 de espada, a carta que encontrou permitiu isso, e surpreendentemente vence o jogo, conquistando a grana. Neste momento “We are Champions”, irrompe em seus ouvidos, é o dia mais feliz de sua vida. Uma nova era lhe começa nesta madrugada.
 

sábado, 7 de setembro de 2013

Jota Quest - Uma nova maldição?

Jota Quest – Uma nova maldição?


Saulo Ícaro

                Era uma noite ensolarada (exagerei, mas até seria provável em se tratando de Irecê, porém só estava calor mesmo) de 20 de Abril de 2011. Irecê vivia a expectativa de um grande show – afinal, é quase que unanimidade os “belos” shows de pagodão e demais ritmos da MPB (Música Pejorativa Baiana) que aparecem por aqui. Jota Quest iria fazer sua primeira apresentação – talvez última – na cidade, e é claro que eu não deixaria de ir... e nem nosso projeto indefinido de herói, Mateus!
                Tudo combinado, descemos pra rua... levei umas brejas que tinha em casa pra molhar o bico. Mateus desde o início já se preocupava com a Lei de Murphy (“se alguma coisa tem a mais remota chance de dar errado, DARÁ”) – algo o dizia que talvez a noite não seria tão boa pra ele.
                A esta altura, Mateus já tinha se deleitado sobre um litro de vinho (fato que a todo o momento fazia questão de lembrar), ainda no colégio (!), não lembro por qual ocasião. Por esse motivo se preocupava em misturar a cerveja. Mas claro que misturar é com nosso amigo! Mesmo preocupado, não deixou de se entregar a outros líquidos (sem pensamentos sujos Duca). Eis que surge, já próximo ao ambiente da selvageria alcoólica de jovens pulando e se drogando ouvindo música alta festa, uma pequena barraca de bebidas, chamada coincidentemente de “Caipirinha do Bad Boy”. Isso logo fez vir à mente de nosotros Tiago Bad, e por isso mesmo Mateus logo sugeriu homenagearmos nosso amigo comprando várias uma caipirinha (que depois viraria duas, três...) – o medo da mistura já havia se dissipado. Nós nem mesmo tínhamos entrado na festa e Mateus já fazia suas típicas caretas sinalizando nível muito baixo de sangue em sua corrente alcoólica. Pois bem, era chegado o momento de entrar na dita festa: Jota Quest nos aguardava!
                Ao adentrarmos a área delimitada para o show, quase que de imediato encontramos alguns de nossos bons amigos. Papo vai , papo vem, risadas, piadas, viadagens de Mateus (normal, normal), som rolando de uma banda que eu nem lembro quem era (mas era boa, admito), eis que num momento de distração – e embriaguez avançada – nosso Dom Quixote do Sertão (nem precisa dizer que é Mateus né?) tropeça – segundo testemunhas este também fora empurrado – em uma elevação na praça, e depois de um “duplo twist mortal carpado invertido em ângulo de 27,3° perpendicular à hipotenusa transversal ao chão” de fazer inveja a Daiane dos Santos, Mateus vai à nocaute, esbarrando-se contra o solo. Em pronta reação (depois de alguns risos escandalosos discretos de parte da galera), Mateus foi ajudado por seus amigos a se reerguer, embora parecesse querer voltar ao chão, sem entender o que havia acontecido.
                Mas esse não era ainda o ápice da noite Murphyniana de Teteu Espíndola, isso viria pouco depois. Após o fenomenal tombo, algumas resenhas se seguiram, e sabem como Mateus zangado é né: ameaça deixar o recinto (quando não tenta acertar alguém com algum objeto inanimado que esteja próximo). Mas dessa vez foi diferente, ele não ameaçou. Simplesmente Mateus, sem prévio aviso ou qualquer cena boiolesca pra chamar atenção, se pôs a ir em direção à saída da festa. Logo que avistei isso – eu também já não estava em pleno controle de minha coordenação motora – avisei a galera e fomos atrás de Mateus, porém em vão. O mesmo ultrapassou os limites da festa, e os seguranças nos avisaram que se fôssemos atrás não mais entraríamos.
– Tchau Mateus! – Dissemos.
                Tais fatos aconteceram antes mesmo de Jota Quest subir ao palco! No outro dia, ao ser perguntado sobre o show, Mateus indagou: “Cara, acordei sem saber de nada. Eu subi no palco e cantei com Flausino?!”. É, bródi, acho que não. Nem mesmo ele sabe como sua mãe ou mesmo sua tão adorada, amável, e delicada irmã não acordaram com sua chegada em meio à madrugada. O fato é: Mateus nunca conseguiu ver um show de Jota Quest (também só foi em um, até onde eu saiba)... seria o capiroto (alien, demo, satan, Mefis Obaid, “Toin Neto”, Voldemort, ou sei lá mais que estranha criatura mítica possa ser) aprontando novamente com o cara, assim como tem feito nas festas do rei do axé, Luiz Caldas? Não se sabe... Certo é que até hoje ele culpa, além de Murphy e sua lei tão apropriada, Bad Boy, com sua barraca de caipirinha, afirmando ter sido ela a responsável por tamanha decepção musical na vida dele.


Obs.: Algo que ele lamenta, não ter ficado no show, mesmo que não lembrasse nada depois. Ele me “inveja” por que fiquei – mesmo que eu não estivesse presente espiritualmente, só fisicamente – eu lembro quase nada depois que ele foi embora... hehehe. Ah álcool.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

THE BAITTOLL'S

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THE BAITOLL’S – A banda de Rock de Mateus.

Por Daniel Pablo
Direitos Reservados


- Porra! O que será que aconteceu? Ele tá demorando muito! – se perguntava Paul, enquanto andava de um lado para outro.
A banda estava na véspera de sua grande estreia, um grande público os aguardava, por isso a grande ansiedade do líder e idealizador do conjunto. Ser um rock star foi a solução encontrada por ele para por fim a sua abstinência vaginal. A ideia surgiu depois de ter assistido ao filme “Quase famoso”, na qual é mostrado os bastidores de uma banda de rock, com ênfase nas drogas e principalmente na pegação. Então o caminho era este, uniria as coisas que adorava: música, drogas e as tão desejadas garotas. Chamou três amigos e pós os planos em execução, mas neste dia o principal vocalista tardava em aparecer.
- O que será que aconteceu com John? – falou Paul, quase chorando.
- Larga de ser chiliquento, daqui a pouco ele aparece – repreendeu Harrison.
- É isso mesmo, vamos aqui ensaiando enquanto ele chega – apoiou Starr.
As reprimendas dos companheiros surtiram efeito. Ele se acalmou e deu inicio aos ensaios. Consigo pensava que tinha que aproveitar aquela chance. Tinham ficado um bom tempo sem treinarem por falta de espaço. Antes os ensaios eram na fazenda de seu pai, mas a barulheira incomodava os animais, razão porque não puderam continuar no campo, além disso, o fazendeiro desconfiava que era a zuada dos rapazes que estaria fazendo com que as vacas dessem leite azedo, prejudicando o principal negócio da família: venda de leite com água. Agora tocavam no quintal da casa de Paul. E foi difícil conseguir esta oportunidade, era um sábado, a mãe estava na Igreja Adventista, o pai não escuta muito bem, e a irmã, que sempre o perseguiu estava viajando, não estaria lá para reclamar e encher o saco. Então, som na caixa.
Estavam os três nos acordes de Across The Universe, quando a harmonia foi quebrada pelo berro de alegria e indignação de Paul:
- John! Finalmente apareceu! Onde o rapazinho estava?
- Vei, desculpa o atraso, tava com minha namorada.
Esta resposta fez o sangue de Paul ferver, John chega atrasado no derradeiro ensaio, além de ter faltado a alguns outros no Achado. E tudo por culpa da namorada. Tudo bem que o cara tem que dar uns beijinhos, isso era inclusive o grande motivo porque fundara os Baitoll’s, mas tem que saber dividir as coisas, ser solidário com os companheiros ainda encalhados no caritó.

- BAITOLL’S, BAITOLL’S, BAITOLL’S, BAITOLL’S – gritavam os fãs diante da demora do inicio da apresentação. A atração anterior já tinha recolhido seus instrumentos a 40 minutos, mas nada de Paul e cia subirem ao palco.
- Caras, vcs vão começar o show ou não? – berrou o empresário na porta do camarim.
- Vamos sim – respondeu Paul - só estamos esperando John chegar.
Paul estava nervosíssimo com a estreia, ansiedade exponenciada pelo novo atraso de John. Para se acalmar, bebia doses e doses de whisky Drulys, mas não adiantava.
Na plateia, os fãs (na verdade uns amigos que foram lá porque Paul implorou) ameaçavam ir embora, quando repentinamente o locutor apresenta os músicos:
- Atenção galera, com vocês: John Lennando nos vocais e guitarra rítmica, Tales Psicopata Harisson na guitarra solo, Duca Starr na batera, e por último, mas bem menos importante, Paul Macteus nos vocais e no violão de babaçu com uma corda só! São os THE BAITOLL’S!

O show, por incrível que pareça, foi um sucesso. No outro dia só se falava nisso na cidade de Irecê, sendo inclusive tocada nas rádios algumas das canções apresentadas pelos rapazes. Os meios de comunicação locais elogiaram muito a banda cover dos Beatles. Outros shows foram realizados, e em cada um deles o público (o público de verdade, e não os amigos) crescia. Aumentava também o reconhecimento da crítica especializada. Até mesmo Antônio Neto deu o braço a torcer e elogiou os Baitoll’s.
Mas Paul Macteus não estava satisfeito, para ele ainda faltava algo, a companheira com quem sempre sonhara, a sua musa sempre imaginada mais ainda não conhecida. As garotas agora falavam com ele, pediam autógrafos, tiravam fotos, mas nada de beijos. Essa sensação era agravada pelo fato de seu parceiro John Lennando estar curtindo um romance sólido e duradouro. Paul Macteus se perguntava o porque de tal discrepância, ele só e John com uma ada. A conclusão que chegou foi que o amigo estava aparecendo, brilhando mais dos que os outros membros, e isso não podia acontecer, a banda era de Paul, ele idealizou e começou tudo, pediu um empréstimo para comprar os instrumentos, mandou fazer roupas idênticas as usadas pelo quarteto de Liverpool, mas quem se destacava era John Lennando. Uma rivalidade foi crescendo no peito do Baittoll Líder, iria dar a volta por cima, no próximo show ele iria colocar as coisas no lugar.
Só que isso não aconteceu, na apresentação realizada no Festival UnderGround Music das Caraíbas, John simplesmente não apareceu, e o que seria a chance de Paul Macteus se firmar na banda se transformou em um pesadelo para o mesmo. John Lennando era o vocalista principal, era o responsável pela maioria das canções. Paul Macteus também cantava, mas não tinha ensaiado a parte do companheiro, só John sabia dublar o John, o verdadeiro John Lennon, Paul Macteus era um dublador inferior – sim gente, nosso amigo metia um play-back nos shows, na maior cara dura, não acredito que alguém pensou que Mateus e cia tocavam alguma coisa. Mas voltando a história, sem muita confiança em substituir Jonh, Paul Macteus pegou o pen-driver onde estavam as canções, e excluiu as que eram incumbência do amigo, deixou somente as que cantava sozinho, poucas na verdade, e como o show duraria cerca de 1 uma hora e meia programou o seu mídia player para executar as faixas varias vezes. Resultado, o show foi um fracasso, foi muito repetitivo, o público vaiou, tacou pedra, e no dia seguinte a crítica meteu o pau, insinuando inclusive a fim do grupo, e a saída de John Lennando que seguiria carreira solo. O não comparecimento deste foi um prato cheio para a impressa sensacionalista que chegou ao ponto de inventar factoides dizendo que o vocalista estava insatisfeito com mediocridade dos outros músicos, que a imperícia destes impedia John de alçar voos mais altos. Nada disso era verdade, John simplesmente não apareceu porque, mais uma vez, estava jantando com a namorada.

No outro dia, Paul Macteus acordou com uma baita ressaca, a leitura dos jornais, que sua irmã tinha deixado propositalmente em sua escrivaninha, o tornou mais amargo. Sabia que tinha sido deixado na mão, mais uma vez, por causa do enlace de John. Estava disposto a encerrar a carreira, aposentar de vez sua viola de uma corda, mas uma visita o anima novamente.
- Din, don! - John toca a campainha, Paul Macteus atende, e ao ver o amigo dispara sua metralhadora de mágoas:
- Onde você estava ontem ????????????? Se esqueceu do show, porra??????????????
- Agora todo mundo ta metendo o pau na gente. E principalmente em mim, enquanto você fica lá namorando, o Paul Teteu aqui fica se fudendo. O show de ontem era para ser de arrasar, agora todos estão rindo e me colocando apelidos, é Paul Macaco, Paul no cú de Macteus, é Paul Merda, é PM pouca merda. Estão todos zoando com a minha cara, a imprensa, a crítica, os bacacas do Pinka Fode (banda cover do Pink Floyd e rival dos Baitoll’s), Carla, Antônio Neto, até mesmo nós, os amigos, estávamos rindo.
O desabafo durou cerca de meia hora, e a tudo John Lennando ouviu com serenidade e paciência. Pediu desculpas, que foram aceitas, Paul Macteus estava mais aliviado. Ademais, John reconheceu o erro e trouxe uma notícia boa, sua namorada tinha um primo, que tinha uma cunhada, que era vizinha de D. Gertrudes, tia de Solange da Farmácia, casada com Necão da Padaria, irmão de Dilva Valadares, que era noiva de Pindobácio Fontes, lateral-esquerdo no time de Chico Lau, pai de Flautiana Lau, prima de Aurélia Madureira, colega de catecismo de Ariosvaldo Pirilampo, colega de escola de Kowly Ronn, que viajou para Lençois com Tassão, que queixou Monalisa, manicure de Genoveva Flores, que foi comida em 2006 pelo Índio Tumbalalá, amigo de Marcos Sodré, que tinha uns conhecidos na secretaria de cultura do município, e que estes últimos iam dar uma força na gravação do primeiro cd dos Baitoll’s. Paul ficou empolgadíssimo com a idéia, e John num gesto de grandeza e amizade deixou a cargo do colega o desenho da capa do disco.

Paul Macteus ficou radiante com a notícia, e se dedicou com afinco a criar a capa do disco, foi uma semana inteira de pesquisa, o cara so falava disso, ficava todo o tempo livre na frente do computador pesquisando a imagem perfeita, buscando uma inspiração, uma inovação, tenha que ser uma capa criativa e original, diferente de tudo o que já tinha sido produzido. O prisma era a marca do Pink, figuras horripilantes eram usadas pelo Iron e pelo Judas Priest, um brasão seria uma boa, mas se lembrou que o Queens e o Pagan Altar já utilizaram este tipo de insígnia, o que fazer então? Teve muitas ideias, uma mais ridícula que uma outra: quatro penicos contendo cada um a foto de um integrante, um recorte de seu narigão, um monte de espermas, nada que se aproveitasse.
Quando sua família já estava começando a ficar preocupada com seu comportamento estranho (e desde quando alguma coisa é normal em Mateus?) eis que surge a grande sacada, uma capa simples e enigmática, sem nome e fotos de ninguém, ia ser de fuder, ia chamar a atenção, seria algo raramente visto. Fez um esboço dela no paint, um fundo totalmente negro, rasgado por uma faixa branca na diagonal, do canto esquerdo superior para o direito inferior, e no centro uma cruz vermelha. Que coisa mais horrorosa! Mas Paul Macteus se sentiu o máximo.

Para a sua surpresa geral, um mês depois, quando as cinquenta cópias do cd foram postas a venda num stand promocional da Cantoria de São Gabriel, a capa idealizada por Paul Macteus fora trocada por outra, totalmente diferente, um fundo vermelho, com faixas horizontais negras, outra coisa horrorosa. Paul Macteus mal pode acreditar, só podia ser um erro de impressão, uma pegadinha do Malandro, aquilo tinha que ser explicado. Desesperadamente saiu correndo em direção a casa do baterista da banda, Duca Starr.
- Duca Starr, Duca Starr, Duca Starr – berrava em agonia Paul Macteus na porta da residência do amigo.
- Duca não Starr – respondeu uma voz de dentro do prédio – Duca Starr na casa de Ró – completaram a resposta.
Ainda atordoado dirigiu-se a casa deste último, encontrando lá o Duca Starr:
- Duquinha, o que aconteceu com a capa de nosso CD?
- Duquinha é o caralho, larga de viadagem!
- Mas o que aconteceu com nosso CD?
- John disse que tiveram que mudar a capa.
- POR QUE??????????????????//
- Por causa do apoio político. Como foi a galera da secretaria municipal de cultura quem descolou a gravação tivemos que fazer uma propaganda discreta do partido do prefeito, daí a cor vermelha da capa.
- E as listas horizontais negras?
- Aí foi John Lennando quem inventou, e com o apoio de Tales Psicopata Harrison.
- ÃÃÃÃÃÃÃÃÃ, só podia ser John Lennando, ele me paga, isso é provocação por que o Flamengo ganhou do Vasco, ele vai ver só.
Chorando, Paul Macteus volta para casa.
Mas isso não ia ficar assim...

O show do grande lançamento do CD dos BAITOLL’S, que se chamava Ler Gibi, seria na Praça Cleriston, no primeiro dia de São João, o quarteto da rua Luís Viana Filho, teria a sua maior plateia, e Paul Macteus estava disposto a se aparecer mais que John Lennando, nesse dia iria a forra.
Logo no começo da apresentação, Paul Macteus surpreendeu a todos, público e banda, com um super solo no seu violão de babaçu com uma corda só, e foi muito escroto esse riff, Slash se tivesse visto, ficaria com inveja. A galera foi ao delírio, como Paul Macteus conseguiu fazer com uma só corda o que os outros virtuosos da guitarra não fazem com seis? Mas as surpresas não pararam por aí, John Lennando estava desafinadíssimo, Macteus modificou os arquivos com as músicas que Lennando dublava, e tinha incluído o solo dele, sem ninguém saber.
Depois de John Lennando ter interpretado Dig a Pony de forma medonha, alternado uma voz fanhosa, com estranhos agudos, Paul Macteus não pode deixar de dar uma alfinetada ao microfone, para todos ouvirem:
- Ta nervosinho com o público John Lennando? Ou é porque sua ada ta na plateia? Ou as duas coisas? – provocou com um riso cínico nos lábios.
Com a tiração de onda a galera foi a loucura, e Paul Macteus emendou outro solo incrível, se Adrian Smith visse se aposentaria.
A plateia ovacionava Paul Macteus, que de jubilo estava quase a gozar. John Lennando entendeu a jogada, o companheiro estava disposto a ridicularizá-lo em público, e logo ele, John Lennando, o astro da banda e que deixou de seguir carreira solo só para dar uma força para os amigos, isso foi demais, não se conteve e mandou essa:
- Macteus, vc ta querendo roubar a cena é?
- Não tou roubando porra nenhuma!
- Ta sim, vc sempre rouba!
- Tou roubando não porra!
- Ta roubando sim, vc rouba em tudo!
- Roubo não!
- Rouba sim, rouba no uno, no dominó, no xadrez, no play station 2 (incrível isso, mas ele consegue), e agora quer roubar a cena!
Paul Macteus não se controlou, jogou o caderno com as canções nas costas de John, que jogou de volta, e ato contínuo Macteus pegou seu violão rosa choque de uma só corda e partiu para cima de John, no que foi contido pelos outros músicos, e toda essa confusão ao som de Yellow Submarine.
E como isso é possível? Os músicos não estava tocando, e sim brigando, mas a música saia das caixas sonoras. Era um playback! Esses pilantras nos enganaram, pau nesses BAITOLAS galera.
Revoltada por te sido ludibriada a plateia começou a atirar pedras no palco, e muitos chegaram a subir no palanque para agredir os Baitoll’s, mas não lograram êxito pela fuga desabalada destes. O fim da banda não poderia ser pior, um grande barraco, e o mico da descoberta do uso do play-back. No outro dia, Paul Macteus ainda teve a cara de pau de marcar uma entrevista coletiva para explicar o fim da banda, mas suas declarações se limitaram a um plágio de uma frase de John, o verídico Jonh Lennon:

- The Dream is Over (O sonho acabou).